“Estresse crônico de trabalho que não foi administrado com sucesso”. Esta é a definição atribuída à síndrome de Burnout em sua classificação entre as doenças no trabalho pela OMS. A CID 11 (Classificação Internacional de Doenças), documento no qual está oficializada essa e outras mudanças, foi concebido durante uma conferência da ONU em 2019, porém sua vigência se deu a partir de janeiro de 2022.

A síndrome de Burnout era considerada, no texto anterior da OMS, como um problema de saúde mental ou quadro psiquiátrico. A compreensão foi transformada para traduzir o verdadeiro sentido da síndrome: um fenômeno diretamente ligado ao trabalho

Com essa nova classificação, o Burnout passa a ser associado ao ambiente de trabalho, suas práticas e gestão, e não mais ao colaborador. Assim, a empresa torna-se responsável pela saúde dos colaboradores. Por isso, realizar ações de prevenção com cuidados ao bem-estar físico e mental dos colaboradores deve ser prioridade do RH.

Segundo pesquisa da ISMA-BR (International Stress Management Association), o Brasil é o segundo país com maior incidência de casos de Burnout. Além disso, é o campeão quando se fala em ansiedade, e o 5º colocado no mundo no quesito depressão

Ao todo, são mais de 18,6 milhões de brasileiros convivendo com esse transtorno, o que equivale a 9,3% da população. Mundialmente falando, a ansiedade afeta mais de 264 milhões de pessoas, e houve um aumento de 15% em relação à última década. 

Sobrecarga, excesso de trabalho, cobrança por produtividade e eficiência operacional, sensação de ter que dar conta de tudo. Esses são alguns dos principais agentes causadores da síndrome. Por isso, é fundamental trazer o olhar do RH para reverter possíveis quadros de Burnout, e principalmente, evitar que os profissionais cheguem até eles.

Continue a leitura e saiba mais sobre as novas definições da OMS, quais os principais sintomas que você pode identificar nos colaboradores e como o RH pode atuar nesses casos. Se preferir, ouça o conteúdo em áudio clicando no player abaixo!

O que é Burnout e por que está entre as doenças no trabalho?

A síndrome de Burnout é uma das doenças no trabalho que vem chamando cada vez mais a atenção, especialmente com sua recente classificação pela OMS na categoria. Trata-se de um estado emocional de estresse crônico associado ao esgotamento físico e mental causado pelo trabalho. Por isso, é considerada como uma doença do trabalho.

São três as principais dimensões que caracterizam o Burnout:

  • sentimentos de esgotamento ou exaustão de energia;
  • afastamento emocional do trabalho e comportamentos de negativismo e cinismo;
  • redução da produtividade e desempenho individual.

O grande problema das doenças no trabalho é que elas alteram processos cognitivos, responsáveis pela memória, raciocínio e percepção da realidade. Consequentemente, a pessoa não se sente mais feliz, perde o sono e, também, a vontade de trabalhar. 

É fundamental o RH compreender que esses sintomas e sinais devem ser avaliados por um médico psiquiatra para a efetivação do diagnóstico. Assim, tenha em mente que não é você, RH, que vai diagnosticar o colaborador, e nem ele próprio. É preciso um laudo médico validando os sintomas e a associação deles ao trabalho. Com isso, é possível dar os devidos encaminhamentos à situação.

Uma vez que o diagnóstico é realizado como síndrome de Burnout, a empresa é implicada como responsável pela situação, e deve agir de acordo com isso. O processo normalmente se dá pela coleta de evidências no ambiente de trabalho, depoimentos e testemunhos de profissionais que convivem na empresa e avaliações do histórico do colaborador em questão. Saiba mais sobre as conformidades jurídicas a seguir.

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Doenças no trabalho: o que diz a lei?

A síndrome de Burnout constava no capítulo de transtornos mentais da CID. Porém, em 2022, a doença foi retirada desta seção e inserida na categoria de doenças do trabalho. Isso porque, para a OMS, conforme mencionado anteriormente, o Burnout é resultado do estresse crônico no local de trabalho, que não foi gerenciado de forma adequada.

Essas alterações descrevem com maior clareza os procedimentos e impactos jurídicos que as empresas podem sofrer em decorrência das doenças no trabalho. Na nova lei, a síndrome de Burnout é comparada ao acidente de trabalho. Desta forma, o colaborador deve consultar um profissional de saúde e, de posse de um laudo, apresentar o seu atestado médico no RH.

Já o empregador deve, com base no atestado recebido, emitir a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), conforme a Lei 8.213/1991. Neste cenário, o empregado tem direito também a estabilidade de 12 meses após a sua alta.

Após comprovação da causa laboral, a empresa pode ser enquadrada no quesito responsabilidade civil, tendo que pagar indenização por dano moral – caso considerada culpada. O valor da indenização leva em conta aspectos como a gravidade da doença ou dano causado e o nível de responsabilidade do empregador. 

Caso o colaborador seja afetado em suas atividades laborais, a situação poderá ser enquadrada como dano moral e, ainda, existencial. Isto porque o excesso de trabalho estaria prejudicando seus hábitos de vida e causando sequelas à saúde. 

Desta forma, a nova configuração de Burnout dentro das doenças do trabalho instituída pela OMS blinda o profissional. Assim, ele consegue ter seus direitos garantidos caso o ambiente de trabalho seja desgastante ou exigente demais.

Como funciona a síndrome de Burnout

Para cuidar cada vez melhor dos seus colaboradores, e também evitar o cenário de problemas com a Justiça do Trabalho, a dica é: fique atento aos sinais de Burnout nos seus colaboradores. Um indicativo claro pode ser, por exemplo, um profissional que se destaca nas entregas, sempre apresenta bom desempenho e, de repente, começa a se transformar.

Ele pode passar a demonstrar sinais como:

  • sentir-se desmotivado para executar atividades rotineiras;
  • incorrer em atrasos no trabalho;
  • não ter capacidade de estabelecer relacionamentos saudáveis;
  • não ver valor nas entregas;
  • deixar de se importar com os compromissos;
  • perder eficiência e reduzir qualidade ou quantidade de entregas;
  • realizar comentários cínicos ou negativos de forma recorrente;
  • etc.

Alterações de estado emocional, transtornos mentais e comportamentais, assim como o Burnout, estão entre as principais doenças no trabalho consideradas como causas de afastamento da atividade profissional.

Não existem necessariamente motivos específicos para o seu surgimento, mas situações do ambiente de trabalho podem contribuir. Por exemplo, a pressão pelo atingimento de metas, o relacionamento difícil com colegas ou gestores, a pouca independência e até a rigidez quando da ocorrência de erros.

Isso sem falar da saúde financeira do colaborador, que impacta diretamente em produtividade e bem-estar. Afinal, muitas vezes, o profissional pode estar insatisfeito com a sua remuneração, ou mesmo enfrentando dívidas que sugam toda sua energia. Isso também contribui para o desenvolvimento do Burnout.

Tratamento e prevenção da síndrome de Burnout

Para evitar que ocorram situações mais sérias por conta de doenças no trabalho, é importante indicar a busca por apoio profissional ao identificar um ou mais dos sinais listados anteriormente.

Além do apoio psicológico, é essencial que a pessoa com a síndrome de Burnout transforme alguns hábitos – seja no trabalho ou no estilo de vida. Aliás, condutas saudáveis evitam que as doenças avancem, além de diminuir o estresse e a pressão no ambiente corporativo

Veja como você pode contribuir com essas mudanças de hábitos, RH:

  • incentive os profissionais para que ao final do expediente eles se desconectem – nada de levar trabalho para casa;
  • planeje junto dos colaboradores os horários de descanso. Fazendo com que eles aproveitem esses momentos para conhecer locais diferentes e ou até comer em um novo restaurante, por exemplo;
  • dê férias para os colaboradores. Afinal, elas são garantidas por lei e todo trabalhador tem direito;
  • estabeleça um plano de carreira com objetivos profissionais e pessoais para os colaboradores;
  • estimule a organização, priorizando as tarefas e estipulando prazos alcançáveis;
  • recomende intervalos durante o expediente, sugerindo uma caminhada ou que o profissional faça uma pausa para tomar um café.

Além disso, ajude a manter um diálogo junto às lideranças. Caso o colaborador se sinta sobrecarregado, ele deve expor a situação, enquanto o RH oferece alternativas para tornar a sua atividade mais leve. Assegure-se, ainda, de que haja uma carga horária definida e justa, a qual permita que as tarefas sejam executadas sem a necessidade de hora extra.

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Como é para o colaborador

Agora que você já sabe como o Burnout funciona e que impactos pode ter para as empresas, pense um pouco também sobre como isso reverbera no colaborador.

Também conhecida como Síndrome do Esgotamento Profissional, a Síndrome de Burnout pode gerar nervosismo, sofrimentos psicológicos e, ainda, problemas de cunho físico, como dores de cabeça intensas e cansaço extremo. Como resultado, é comum a pessoa dormir por muitas horas (ou mesmo perder o sono) e acordar cansada, sem energia para fazer suas tarefas cotidianas.

Pense em uma situação comum no ambiente de trabalho: um colaborador tem uma ideia rejeitada pela equipe. Mas, quando isso se repete várias vezes, esse profissional começa a se questionar sobre o motivo de suas ideias serem descartadas com frequência, gerando impactos na confiança e autoestima

Quando a pessoa não se sente bem com seu próprio rendimento, qualquer situação pode agravar esse quadro e desencadear em um transtorno emocional. Por isso, esse contexto merece atenção extrema do RH e das lideranças mais próximas ao colaborador.

Os principais sintomas da doença para quem está passando por ela são: 

  • Desgaste físico e mental;
  • Dor de estômago, nas costas e nos ombros;
  • Alterações no apetite;
  • Problemas gastrointestinais;
  • Insônia;
  • Irritabilidade;
  • Dificuldade de concentração;
  • Excesso de negatividade;
  • Insegurança;
  • Alterações de humor repentinas;
  • Sentimento de derrota e incompetência;
  • Isolamento social;
  • Fadiga;
  • Pressão alta;
  • Alteração nos batimentos cardíacos (arritmia). 

Geralmente, esses sintomas surgem de forma leve e esporádica, mas são altamente prejudiciais à saúde do colaborador. Além disso, com o tempo, a tendência é de que eles aumentem de intensidade, passando a prejudicar diretamente a relação com o trabalho.

Qual o papel das empresas em relação às doenças no trabalho?

No tópico anterior, fica evidente a dimensão dos impactos que as doenças no trabalho, como o Burnout, podem causar no colaborador. Por isso, a síndrome foi classificada desta maneira pela OMS. Assim, as empresas precisam estar cada vez mais atentas, visando que situações como essa não sejam frequentes.

Além disso, um levantamento da OMS mostra que os transtornos mentais custam cerca de 1 trilhão de dólares por ano à economia global. Esse prejuízo não é consequência somente de demissões, absenteísmo e afastamentos, mas também da queda na produtividade dos colaboradores

Ou seja, diante desse cenário de potenciais prejuízos para todos, as empresas e seus RHs têm papel fundamental. Então, é indispensável perceber quais os problemas enfrentados pelos colaboradores para oferecer total apoio.

Como o RH deve agir

Primeira dica: o RH não deve julgar um colaborador que se encontra com uma doença de trabalho, mas sim ser um aliado no processo de melhora. Além de conhecer bem os sintomas que envolvem os males, é essencial agir para promover as melhorias necessárias. Atuar de forma preventiva também é fundamental, evitando que as doenças se instalem.

Confira algumas dicas que podem ajudar no estado de saúde do colaborador e, também, evitar que mais pessoas sejam afetadas.

1. Faça avaliações do ambiente de trabalho

Para evitar que os profissionais sofram com doenças no trabalho, é importante garantir que o ambiente seja agradável e motivador. Desta forma, o RH deve promover mudanças, visando a melhor experiência do colaborador.

É preciso assegurar que os profissionais se sintam parte do todo e vejam que fazem a diferença na organização. Para isso, institua pesquisas de clima e avaliações recorrentes, entendendo como está a visão e percepção dos colaboradores sobre todo o ambiente.

2. Desenvolva uma boa comunicação interna

Garantir o diálogo entre colaboradores, líderes e demais gestores é essencial, pois esse acesso fácil cria um sentimento de pertencimento e valorização. A comunicação deve ser uma via de mão dupla, ou seja, o profissional deve dar e receber feedbacks constantes, a fim de ter conhecimento sobre a expectativa da empresa em relação a ele.

Outra dica: promova ações que demonstram o cuidado da empresa com os profissionais. Um exemplo é a amamentação no trabalho. A adoção de políticas de bem-estar e inclusão demonstram que a empresa se preocupa com o bem-estar da equipe e busca atender suas necessidades.

Tudo isso contribui para melhorar a satisfação dos colaboradores e auxilia no seu bem-estar e na felicidade dentro do ambiente de trabalho.

3. Reconheça os colaboradores

Além do salário e dos benefícios já disponibilizados aos colaboradores, a empresa pode desenvolver ações de reconhecimento pelo trabalho realizado. É possível criar planos de carreira e oferecer treinamentos e orientação profissional. Também valem ações mais simples, como reconhecimento diário por desempenho ou elogios sobre a performance.

Oferecer plano de saúde é um diferencial que pode ajudar – e muito – em casos de doenças no trabalho. Dessa forma, o profissional fica mais tranquilo e sabe que poderá contar com o suporte adequado se vier a precisar.

4. Promova ações de educação emocional 

Promover palestras e visitas de profissionais da área de educação emocional para conversar com os colaboradores é uma iniciativa muito valiosa. É preciso demonstrar aos profissionais e gestores que é importante falar sobre seus anseios em relação ao trabalho. O assunto ainda é um tabu, o que torna esse contexto bem mais delicado. Por isso, deve haver sempre um canal aberto para o diálogo.

É possível prevenir a Síndrome de Burnout? 

Como demonstrado neste conteúdo, o primeiro passo para evitar o Burnout e qualquer outra das doenças no trabalho ligadas ao estresse é proporcionar qualidade de vida no ambiente profissional e fora dele. Isso é possível adotando algumas das posturas citadas anteriormente, tanto por parte das organizações, quanto dos colaboradores.

Do lado da empresa, é possível ainda realizar ações preventivas, como criar a “semana da saúde” e convidar profissionais que abordem assuntos relacionados aos desafios do dia a dia. Você pode, por exemplo, aplicar pesquisas por e-mail coletando as principais preocupações e dúvidas dos colaboradores sobre o assunto para determinar o tema das palestras. 

As doenças relacionadas com o trabalho devem ser levadas a sério tanto pelo empregado, quanto pelo empregador. A síndrome de Burnout agora está neste rol, e o RH precisa estar atento para cuidar dos colaboradores e também evitar penalizações judiciais.

Você já teve colaboradores diagnosticados com uma dessas doenças no trabalho na sua empresa e quer saber como proceder ou compartilhar sua experiência? Deixe aqui nos comentários e continue acompanhando o blog da Ahgora para novas informações!